Radicalismos


O espetro político ou ideológico é muito vasto e traduz mesmo um continuum que vai da esquerda radical ao ultraconservadorismo da direita.
Nas sociedades que estão em equilíbrio social e económico estas franjas constituem uma pequena fração perfeitamente controlada pelos cidadãos e forças sociais e políticas. Quando começam a ocorrer desequilíbrios, como é o caso presente, o desconforto generaliza-se como um vírus altamente contagioso e extremam-se certas posições. Muitos dos que foram, e ainda são, o garante da estabilidade da paz social apresentam sinais de polarização que se acentuam dia para dia deixando vazio um espaço vital. Basta estar atento, ouvindo os comentários do cidadão comum ou lendo os desabafos e críticas nas redes sociais, sobretudo aqueles que ainda há pouco tempo não faziam qualquer mossa nem manifestavam tal tendência, para confirmar esta preocupação. Os que se posicionam à “direita” afastam-se cada vez mais para o polo conservador, e até mesmo ultraconservador, e os que se situam à “esquerda” radicalizam os seus comentários, opiniões e soluções. Mesmo os que navegam no “meio”, ondulantes ao sabor das suas conveniências e interesses, também começam a manifestar-se, coisa curiosa, porque, de um modo habitual, não costumam exprimir muitas opiniões. A situação em que nos encontramos não é habitual e por isso mesmo sentem - estão no seu pleno direito -, que devem queixar-se, procurando os que lhes oferecem melhores soluções, muitas das quais se identificam com a tríade “Deus, Pátria e Família”. Não é só em Portugal que se observa uma aproximação a este polo, protagonizado durante muito tempo pela religião, mas também não é por uma questão de fé. O que está em causa são os princípios que a religião representa, facto que leva uma parte significativa da sociedade a aceitar soluções do tipo nacional-populismo.
A crispação aumenta de dia para dia, o radicalismo da direita e da esquerda também, o bom senso desaparece, as soluções defendidas para combater a crise são díspares e contraditórias, provocando anticorpos, gerando incompreensões e motivando o despertar de velhos ódios ideológicos que, se atingirem um nível crítico, podem terminar em violência.
A violência, nas suas múltiplas formas, mesmo a mais destruidora, pode emergir mais uma vez, causando dor, sofrimento e morte.
O homem é atreito à compaixão e gosta de saborear a paz, a alegria, o bem-estar e cultivar a solidariedade. É capaz de tudo isto, já provou várias vezes, mas para que possa alcançar a quietude social precisa, paradoxalmente, de vez em quando, mergulhar na lama do sofrimento e da convulsão. Gosta de renascer, sempre gostou, um empenho bíblico, renasce como a fénix, mas esta não tinha impulsos suicidas. O homem tem.
Os primeiros sinais estão aí, e os políticos, face visível da crispação social, já utilizam expressões e manifestam atitudes que convidam ao confronto.
Grande parte da população perfila-se para aderir a movimentos e correntes antagónicas, que em vez de contribuírem para a resolução de problemas poderão originar situações muito graves.
Soluções? Para já é necessário estar atento e analisar os fenómenos sociais, denunciar os riscos resultantes de uma polarização “bélica” e criar mecanismos que possam tranquilizar e dar esperança às populações. É possível, basta que não se empobreça demasiado a sociedade, que se persigam implacavelmente os prevaricadores, que se responsabilizem os agentes políticos e que os cidadãos tenham mais intervenção cívica e política e que saibam os riscos da polarização extrema, desconfiando dos que têm soluções na manga, que na maioria dos casos não passam de cartas viciadas.

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