"Texto Fantasma"...



Escrevinhei e publiquei um texto. No dia seguinte, de manhã, olho e leio o texto. Que texto tão estranho. O texto aborda os mesmos tópicos, tem a mesma construção, transpira os mesmos sentimentos, revela experiências idênticas, mas é diferente. Olho e leio. Leio e olho. Senti que já o tinha escrito, os mesmos tópicos, as mesmas sensações, os mesmos espaços, os mesmos sentimentos, só a versão é que era diferente, muito mais bela e mais doce. Fiquei perplexo. Já tinha escrito sobre este assunto? Como é que já tinha escrito e não me recordo? Mas se já o tinha escrito, então, tratava-se de uma versão muito mais bela e mais escorreita. Tinha mais encanto. Agarrei-a. Gravei-a. Suspirei. Já não foges! Estás presa. Agora tenho as duas versões. Gosto muito mais desta, a versão fantasma, mais pura, mais límpida e mais sedutora. Vou relê-la. Fugiu! Fugiu? Como? Onde é que tu estás? Fiquei triste. Apareceu-me a primeira versão em vez da outra, a versão fantasma, que me deliciou, porque as palavras eram mais doces, mais leves, mais subtis, mais profundas, mais quentes e mais inebriantes. Subitamente, apareceu-me novamente a bela versão fantasma. Pensei, andas a brincar comigo, mas agora não te vou deixar fugir. A impressora apanhou-a e eu suspirei fundo. Uma enorme sensação de alívio invadiu-me provocando lânguido prazer. Agora vou comparar as duas, aquela que escrevi e a outra, mais bela, mais escorreita, mais pura, mais límpida, mais sedutora. Que manhã mais turbulenta, o mesmo tema, a mesma viagem, as mesmas terras, as mesmas belezas e as mesmas sensações em dois textos diferentes, o meu e o de um fantasma que andou a brincar comigo. Prefiro o do fantasma, mais belo, mais puro e mais sedutor. Agora, que já o tinha aprisionado, fiquei mais sossegado. A folha dobrada a meu lado era a prova de que tinha capturado o tal escrito fantasma. Começo a lê-lo e comparo-o com o que tinha escrito. Mas é igual! Como é possível? Eu vi e li um texto muito mais belo, mais puro e mais sedutor do que o meu. Fugiu-me! Como é possível ter fugido, deixando-me o que tinha escrito? Procuro-o e não o encontro. Eu li-o. Era muito mais lindo do que o meu. Onde paras texto lindo, porque me foges? 

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