São Pancrácio

Fiquei surpreendido ao saber que nalguns bares espanhóis começa a ser usual haver uma imagem de São Pancrácio. Dizem que é para pedir sorte ao jogo. Jogos sociais e jogos de azar estão ligados a uma figura que não tem nada a ver com o jogo. De facto, o pobre Pancrácio, pobre porque o decapitaram por ser cristão, era rico. Herdou uma grande fortuna e enriqueceu ainda mais quando foi para Roma pela mão do seu tio protetor. O imperador Dicocleciano tentou que o jovem abjurasse a sua religião, mas não conseguiu. Além disso também não apreciou muito o facto de andar a distribuir a sua riqueza pelos pobres da cidade. Resultado? Uma cabeça a menos e um santo a mais. Depois o tempo encarregou-se do resto. A lenda cresceu, frutificou, e Pancrácio tornou-se no arauto da sorte. Sorte ao jogo, sorte ao trabalho para quem não tem e sorte na saúde. O santo porta um livro aberto onde se pode ler "Veni ad me et ego dabo vobis omnia bona" (Vinde a mim e eu darei todos os bens). Uma frase bíblica que deve ter sido distorcida, levando os seus admiradores, fãs ou fiéis a desejar ter sorte da maneira mais fácil, ao jogo! Logo, rezam e pedem ao São Pancrácio bens, dinheiro, mas também trabalho e saúde.
Atendendo ao facto de os portugueses serem amantes de ganhos fáceis, basta ver a obsessão que têm por tudo o que é jogo, raspadinhas, euromilhões, concursos e entretenimentos televisivos, só para falar dos mais comuns, sugeria que São Pancrácio fosse oficialmente considerado como patrono dos portugueses. E como também tem atributos em matéria de trabalho, ajudando os que não tem, e são centenas de milhares os portugueses a viverem no desconforto e miséria do desemprego, logo, mais uma razão para o elevar a santo patrono de Portugal. Vá lá, por acréscimo, também ajuda na saúde, o que nos tempos que correm é uma benesse.
Já vi um ou outro São Pancrácio em algumas montras, tosco e inexpressivo devido à frieza do marfinite. Com aquele aspeto não deve ajudar muito. Vou ver se consigo arranjar um mais esbelto, elegante e com cheiro a arte, não para ter sorte, mas para meditar sobre a mesma e gozar a arte. Não vai ser fácil. Quem sabe se não consigo despertar a atenção de alguns santeiros capazes de produzir Pancrácios para dar sorte aos portugueses. E se os portugueses não aderirem, o que não acredito, sempre podem exportar para Espanha. Bares não faltam naquele país. Pelo andar da carruagem qualquer dia passam a ser capelas dedicadas a São Pancrácio.

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