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Mulher de vermelho

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Vou a correr, não posso atrasar-me. Uma figura de vermelho saltou do lado esquerdo. Parei. Tratava-se de um cartão recortado em forma de mulher preso a um poste. Fiquei curioso. Tinha uns dizeres. Li-os. Tratava-se de uma iniciativa relativamente ao “Dia internacional para a eliminação da violência contra as mulheres”. Passei a ter tempo, deixei de ter pressa. O cartaz dizia o seguinte: “Foi espancada durante 12 anos... Entre as sequelas com que ficou, conta-se a parcial deficiência de uma das mãos. A sua relação com o marido, quando começaram a viver juntos era normal: “Ele era atencioso, moderado, não imaginava o que se iria passar mais tarde...” Considerei a denúncia forte e impressionante. Por isso pus-me a refletir sobre o assunto enquanto via passar as pessoas. Duas senhoras, que iam a atravessar a estrada, embicaram diretamente para a figura de vermelho. Começaram a ler mas puseram-se logo a andar. Que raio! Porque é que não leram a pequena história? Continuei parado jun

Afinal "estão ali", ou estavam!

Em miúdo comecei a ouvir que havia ovnis. Pedi algumas explicações sobre o tema; disseram-me que eram seres de outros planetas que vinham até nós em discos voadoras. Que aspeto é que têm, como falam e onde é que vivem foram algumas perguntas que não deixei de formular. Apontavam para a Lua e diziam-me que viviam lá seres muito estranhos. Eu acreditei, e comecei a passar horas, sobretudo durante a lua cheia, para ver se via algum. Depois foi Marte e até Vénus como sendo os locais de onde eles provinham. Eu lia banda desenhada e muitas das aventuras tinham a ver com seres muito esquisitos daqueles planetas. Eu acreditei. Um pouco mais tarde, não muito, ficava de ouvido atento ao rádio à espera de comunicados de outros mundos. Como tinha ouvido falar nisso, aproveitei as ondas curtas para ver se seria o primeiro humano a entrar em contacto com outros seres. Nada, só aqueles estranhos ruídos próprios das ondas curtas. Desisti. No entanto, continuei a alimentar esperança de que um dia s

Saúde, negócio e turismo

Há uma tendência global para nivelar os comportamentos dos seres humanos, não em função de princípios éticos ou regras morais, mas sob a alçada de interesses pessoais e económicos. Mesmo que as leis de alguns países sejam elaboradas com base em princípios éticos ou ditadas pelas regras morais, outros conseguem não ter legislação ou, então, quando a produzem, vão de encontro a desejos óbvios. Quando surge esta discrepância é fácil de prever o que irá acontecer, os que vivem em países com legislação "superior" vão a esses paraísos e conseguem realizar os seus sonhos. No fundo, os paraísos não são só fiscais, há também paraísos na área da saúde.  A saúde tornou-se um dos maiores negócios da humanidade. O turismo da saúde constitui uma realidade em alguns países e, agora, face à tal discrepância legal, muitos deles sabem como abrir as portas para esse negócio. O turismo da saúde atrai, sempre atraiu e vai continuar a atrair.  Temos consciência da deslocalização de muitas in

Paz

É um sítio mágico, só pode. Sempre que vou à localidade entro naquele espaço. A alvura das paredes e o silêncio entrecortado por agradável música de fundo faz sentir a alegria e o renascer da paz. Há qualquer coisa de misterioso que convida à reflexão, ao abandono dos sentidos e ao adormecimento dos problemas. Mesmo o frio é diferente, enquanto lá for agride o pescoço, aqui não, um calor natural que arrefece a inquietação e alumia a mente. Há qualquer coisa de misterioso que me impele, mesmo que seja por breves minutos, a entrar neste espaço. Faço-o com prazer e até por necessidade, porque há algo de misterioso que não consigo explicar. Entrei, estava vazio, exceto na capela lateral. Uma senhora vestida de casaco vermelho rezava com empenho à Senhora. Uma pessoa de fé, naturalmente. Não sei o que lhe disse ou o que pediu, mas fosse o que fosse decerto terá sentido tranquilidade, porque o ambiente está repleto de partículas de paz que se respira e que se sente. Olhei para aquele qua

Meninos roubados

Certos acontecimentos causam-me estranheza e incompreensão. Dou voltas e mais voltas, mas não consigo encontrar justificação para os ditos. É certo que os seres humanos são todos diferentes uns dos outros, física e intelectualmente, isso é bom, mesmo desejável, desde que não implique a adoção de atitudes que possam provocar dano nos seus semelhantes. Em Espanha o fenómeno dos meninos roubados à nascença é uma das maiores obscenidades que pode atingir uma sociedade, e que merece algumas reflexões. Cerca de 300.000 pessoas terão sido atingidas por um processo de falsas adoções e compra de bebés. Tudo começou com a guerra civil em que eram retiradas às combatentes republicanas presas os seus filhos para serem entregues às famílias franquistas. Uma estratégia maligna, castigar as republicanas e “nacionalizar e cristianizar” os pequenos. Lentamente o sistema “aperfeiçoou-se” com a retirada das crianças aos pais sempre que estes necessitassem de socorrer das instituiç

"Pois, pois!"

Há dias numa consulta de rotina de medicina do trabalho tive a oportunidade de observar um trabalhador, obeso, de 45 anos de idade, que referenciou um historial de quatro enfartes. - Quatro enfartes? É obra! Exclamei. A sua resposta, acompanhada de um sorriso tipo “pois, pois”, foi a seguinte: - Os médicos dizem que eu tenho um coração muito forte para aguentar quatro enfartes! O exame continuou e perguntei-lhe se tinha sido fumador. Olhou-me, relançando novamente o sorriso “pois, pois”, e, abanando a cabeça, disse que continuava a fumar. Fiquei perplexo e sem palavras. - Mas assim corre riscos muito graves! – Oh senhor doutor já tentei tudo, fui a consultas de desabituação mas não consigo. Da última vez que tive um enfarte foi a própria médica que disse que não valia a pena deixar de fumar, porque senão entrava em stress e era pior. - !?!. Calei-me. No entanto, a reação do trabalhador à minha conduta foi interessante. - O senhor doutor parece que ficou preocupado! – Oh homem estou me

Praxe, crime, estado.

Eu acompanhei o caso na altura. Fiquei chocado porque não consigo imaginar o mau uso da praxe, uma forma de iniciação que deve respeitar sempre os direitos dos envolvidos de modo a facilitar a integração num meio novo e criar bases para longas e inesquecíveis amizades. O jovem universitário em causa foi objeto de práticas que lhe provocaram a morte. Nestas circunstâncias mandam as regras que se investigue o caso e que sejam punidos os autores.  Praticamente tudo o que acontece em nosso redor é rapidamente esquecido e, em certa medida, substituído por outros com prazo de validade muito curto, foi o que aconteceu com este caso. Hoje li uma notícia sobre este assunto. Fiquei um pouco perplexo, não porque o tribunal de relação do Porto tenha confirmado a decisão do tribunal de primeira instância, obrigando a universidade a indemnizar os pais pela morte do filho, mas por causa do crime em si mesmo. Curioso. O jovem morreu em consequência de práticas violentas cometidas pelos praxistas