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Sabor a doce...

O sabor doce e quente de uma manhã de sábado desperta algumas emoções suscetíveis de fazer esquecer o resto de uma semana de trabalho e de muitos problemas. É curta, é suave, é prometedora, tem uma ação analgésica e consegue despertar lembranças de um futuro anunciado.  Sabe bem apreciar o sabor doce e quente de uma manhã de sábado, nem que seja por breves momentos, nem que se vista do manto da ilusão. Sabe bem e chega para quem acredita ainda em seres férteis de bem. Um bem escasso que se esgota permanentemente.  Sabe bem.

Arte...

Os dias enchem-se de lembranças sem sentido. Resta a noite para poder despejar os dejetos da vida e respirar o ar puro de desejos perdidos no meio da louca turbamulta. Olho em redor e reparo em pequenos pormenores. Os melhores provém do exercício da arte. Arte da música, do canto, da pintura, da escultura, da escrita, do teatro, do fado e da beleza sem fim, que se esgota em cada segundo que passa mas permanece eternamente na alma.  A arte é a face da verdadeira essência do divino. Encerra sem si o belo, a tranquilidade, a esperança, a justiça e o mais puro dos amores. E há quem ande por aí, nos cantos, nas esplanadas, nos santuários, nas peregrinações e em adorações à procura de fantasiosas explicações. O melhor é mergulhar na arte, seja ela qual for, e morrer afogado na mais pura e perfeita embriaguez.  

Votação

Sinto uma enorme frustração quando vejo alguém a querer impor a sua visão do mundo, sobretudo quando está encoberta por regras e comportamentos de natureza moral. Não é que tenha nada contra a moral, apenas sinto desconforto quando me querem impor a dos "outros". A minha não deve ser das melhores, confesso, mas mesmo assim posso afirmar que faço os possíveis para conciliar a liberdade com os mais básicos e elementares princípios de convivência entre os seres humanos, sejam eles quais forem.  A aprovação pela Assembeia da República de alterações à Lei da interrupção voluntária da gravidez causou-me desconforto. Pagar taxas moderadoras? Não é o que mais me preocupa. O que me incomoda é o "aconselhamento psicológico obrigatório" e a presença da "autoridade moral" representada pelos médicos objetores de consciência. Há qualquer coisa que não está bem. Não sou a favor do aborto, como é óbvio. Opinião partilhada por muita gente, inclusive muitas que são "

Limões...

Convivi sempre com pessoas de idade e aprendi muito com elas. O conceito de que a idade acarreta bom-senso, paz, serenidade e sabedoria é verdadeiro, mas só em parte. Acompanha-a outras facetas, ângulos sombrios e tristes, marcadas pelo arrependimento, subversão, doença, sofrimento e a estranha percepção de que o fim está ao virar da esquina mais próxima. O livro, “A mesa de limão”, de Julian Barnes, escritor britânico, demonstra, através de vários contos as diferentes realidades emergentes no decurso do envelhecimento. A escolha do título, baseou-se na simbologia chinesa, segundo a qual o limão representa a morte. Ao mesmo tempo que lia esta obra, deliciava-me com uma outra, “Gente de palmo e meio” de Augusto Gil. Os contos deste genial autor focam as crianças com as suas aspirações, visões do mundo, virtudes, traquinices, medos, desejos, insegurança, tragédias, alegrias e sempre muita esperança mesmo entre os mais desafortunados; em perfeito contraste com a obra de Barnes. Aug

"Verdade ao anoitecer"...

O peso do dia faz-se sentir ao anoitecer. Por vezes o mundo lembra-se de rolar no lombo. É duro. Durante a manhã o cinzento tomou-me com raiva, com rancor e com desprezo. Apanhou-me. É tão fácil ser-se apanhado, basta estar a pensar no azul do céu escondido e no brilho da névoa de espuma branca onde os anjos se refrescam com algodão de açúcar. Não se dá conta das suas presenças. Apenas se sente o odor a alegria. Gosto do cheiro das almas. O trabalho prolongou-se numa longa rotina, aos soluços, entremeados por algumas conversas ricas, originais e por outras em que o silêncio imperava. As conversas surgem através dos sinais que os olhos esfomeados lançam nos demais. Olhares quentes, sedutores, tranquilos, soltos e verdadeiros. Olhares que anunciam planícies ricas de ideias e prenhes de histórias. Há outros olhares, os que fulminam, os que fazem doer, os que eu não gosto de ver, os que agridem sem falar e os que queimam sem pestanejar. Não quero ouvi-los. Não falam. Também não os enten

"Manhã cinzenta"...

Uma manhã cinzenta em que a opinião se vestiu de inconveniente e enfeitou-se de arrogância e prepotência, talvez para fazer combinação com a sua visão imperativa do mundo e ausência de bom caráter. Incomoda-me certas observações ou comentários quando são lançados gratuitamente no ar através de palavras sobretudo os comentários sem autor. Incomoda-me e entristece-me, porque julgam que têm capacidades para opinar sobre o trabalho dos outros. Fico desfeito. Sinto o meu ser a esfarrapar-se em tiras de tristeza sem limite. Tudo porque a discordância atinge foros de obscenidade. Podia ter ficado calado. Podia ter comentado fria e cinicamente, mas não, libertei a minha alma que disse o que tinha a dizer. Concordo com ela, em absoluto. Libertar os sentimentos despertados por injustiças, que devem esconder insuficiências ou frustrações de longa data, ainda é o melhor. Não é que me alivie muito. Não é que vá mudar o que quer que seja. A natureza humana é violenta e ingrata. Mostra frequentement

"Tela de um dia"...

O dia está prestes a sucumbir à força do ritmo da natureza. Um ritual patético que nem sempre trás algo de novo. Tenho que inventar coisas novas, sedutoras, tristes, esperançosas, loucas, divertidas e até mesmo passear recordações esquecidas ou perdidas. O mundo é uma tela vazia, feia, descorada, sem sentido e sem brilho. Para ter algum significado ou vida é preciso pintá-la, dar-lhe cor e beleza de forma a poder ser pendurada ao lado das longínquas estrelas. Só assim o mundo tem algum sentido. O que vou fazer? Pintar uma tela com letras, frases e pensamentos retirados da minha delicada e sensual paleta de cores.