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Votação

Sinto uma enorme frustração quando vejo alguém a querer impor a sua visão do mundo, sobretudo quando está encoberta por regras e comportamentos de natureza moral. Não é que tenha nada contra a moral, apenas sinto desconforto quando me querem impor a dos "outros". A minha não deve ser das melhores, confesso, mas mesmo assim posso afirmar que faço os possíveis para conciliar a liberdade com os mais básicos e elementares princípios de convivência entre os seres humanos, sejam eles quais forem. 
A aprovação pela Assembeia da República de alterações à Lei da interrupção voluntária da gravidez causou-me desconforto. Pagar taxas moderadoras? Não é o que mais me preocupa. O que me incomoda é o "aconselhamento psicológico obrigatório" e a presença da "autoridade moral" representada pelos médicos objetores de consciência. Há qualquer coisa que não está bem. Não sou a favor do aborto, como é óbvio. Opinião partilhada por muita gente, inclusive muitas que são "obrigadas" a abortar.  Conheço algumas. Partilharam comigo as suas emoções e razões. Não sou juiz de ninguém, nem tenho competência para falar em nome de qualquer ser ou princípio divino. Jogo no campo da humanidade, com as suas grandezas e misérias. Muitas sofrem por fazer o que fazem, mas o mundo parece interessar-se por elas apenas nalguns momentos, enquanto noutros são perfeitamente ignoradas e desprezadas. Ser obrigada a  "aconselhamento psicológico" pode, para muitas, sobretudo as que não querem ser alvo de uma atenção tão particular, ser agressivo e até humilhante. Têm de expor a sua intimidade e agora também têm de desnudar a alma. Deve ser muito doloroso para algumas. A presença de alguém que não quer fazer o abortamento é também elucidativo da "autoridade moral". O que é que eles têm a dizer ou a fazer? Se não querem participar no ato, e têm todo o direito, então para quê impor a sua "alva moral"? Custa-me assistir a este episódio. Não sou deputado, mas já fui. Sei bem como são "feitas as coisas". Sei perfeitamente quais as forças em jogo e quais os seus interesses em interferir em certos assuntos, não é só pelo problema em si, caso do aborto, que deve ser prevenido, como é óbvio, mas devido ao facto de ter fortes implicações noutros setores.
Se fosse deputado teria votado contra esta forma de imiscuir em áreas de tão grande sofrimento. Violaria a disciplina de voto? Sim, mas não violaria a minha consciência. Seria corrido na primeira oportunidade? Claro que sim. Recordo-me de uma discussão no meu grupo parlamentar, aquando da minha passagem pelo assembleia, onde afirmei: - Estou aqui sem saber como. É a primeira vez e vai ser a última. Olharam para mim surpreendidos. Quem não ficou fui eu. 

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