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Anónimo

Cada vez mais me convenço de que a melhor forma de viver é passar despercebido, comentar anonimamente ou não ter qualquer relevância pública. Ser uma merda entre os demais deverá ser a regra número um para garantir às nossas existências o máximo conforto. Presumo que esta regra é crucial, determinante mesmo, para se chegar a algum lado sem sobressaltos de maior ou, então, sempre evita que sejamos vítimas de mal entendidos. Ler um texto de um autor anónimo é completamente diferente de um conhecido. Se for anónimo, ou desconhecido, o resultado é um, mas se o leitor conhece o autor, então, as coisas mudam de figura. Lá diz o ditado que "santos ao pé da porta não fazem milagres". Claro que não, e os outros idem aspas aspas, mas como ninguém os conhece ainda lhes é dado o benefício da dúvida de que são os melhores, até mesmo santos, fazendo-se, muitas vezes, de santinhos, para convencer o próximo. Gaita. Começo a estar farto de tanta prosápia, de incompetência, de arrogância, de

"Nesta igreja estâ a milagroza imagē"

Consegui acabar as consultas a tempo na parte da manhã. Desloquei-me até Pombal, onde almocei. Pedi grelhado misto à senhora, o habitual para quem se comporta como um animal que tem fome e que não está para experiências, gastando o pouco tempo do meio do dia. Enganou-se, trouxe-me entrecosto. Não disse nada, até agradeci porque foi super rápida o que me permitiria descansar um pouco e beber um segundo café, coisa que só faço aqui. Passei o rio, desloquei-me à esplanada e fiquei aborrecido. Não tinham posto as mesas e as cadeiras. Recusei ir para o interior do café. Com um dia destes seria uma heresia. Que fazer, então. Muito simples. Entrei na igreja da Nossa Senhora do Cardal, onde se encontra a "milagroza imagē", e aí permaneci até retomar o trabalho. É um local encantador, fresco, suave, elegante, excelentemente bem cuidado e vazio como é recomendável para uma pessoa como eu. Olho para as paredes e vejo nichos, santos e o local onde o Marquês descansou durante alguns anos

Rosa vermelha

Manhã quente, demasiado para o meu gosto. Disse a frase costumeira, já venho, vou tomar um café. Ninguém respondeu, não havia necessidade, os trabalhadores ainda não tinham concluído o ritual dos exames habituais, é o que faz ter a mania de chegar "antes do tempo". Não me importo, porque confere-me o direito a saborear a minha bebida preferida, respirar o ar matinal, olhar para as faces recém despertas, umas imbuídas de alegria, outras de tristeza e algumas atormentadas pela angústia, enfim, almas ainda meio despidas pela noite, almas a transbordar sinceridade, porque é a esta hora que as suas janelas se entreabrem, permitindo ver o seu interior. Não se apercebem. Sorrio. É bonito de se ver. Cruzei-me com algumas, muito poucas. Enquanto me dirigia até ao café, lembrei-me de uma consulta do dia anterior em que observei uma jovem, que, na madrugada da serenata, foi atropelada, tendo os autores fugido sem prestar os cuidados necessários. A sorte esteve do seu lado. Apesar de ter

Prémios Darwin

Em tempos adquiri um livro com um título interessante: “ Prémios Darwin”. Mas, o subtítulo era ainda mais curioso: “ Prémios à estupidez humana”. Trata-se de uma coletânea de histórias cujos protagonistas acabam por sucumbir devido a erros e comportamentos lamentáveis. Wendy Northcutt explica o sentido dos Prémios Darwin (também há menções honrosas!) numa base evolucionista. Deste modo, segundo a autora, os “ Prémios Darwin homenageiam aqueles que asseguram a sobrevivência a longo prazo da nossa espécie, retirando-se eles próprios, de uma forma totalmente idiota, do fundo genético da nossa espécie. Contribuem, assim, para o aperfeiçoamento da espécie humana. Histórias mirabolantes que vão desde o larápio que tenta roubar os fios elétricos sem desligar a corrente passando pelo homem que acende o isqueiro para espreitar dentro de um recipiente com gasolina, ou do terrorista distraído que abre a carta armadilhada que lhe foi devolvida por insuficiência de selos, ou ainda de um outr

“Time me, gentlemen, time me”

O erro médico, a negligência e as respetivas responsabilidades são alvos de preocupação e de reflexão, quer por parte dos médicos quer por parte dos juristas e legisladores. O amplo leque das causas e fatores subjacentes ao seu aparecimento começa a ser melhor caracterizado . A história da medicina está repleta de inúmeros casos paradigmáticos de erros resultantes de vários fatores . No século XIX, um notável e distinto cirurgião escocês, Robert Liston, caracterizou-se pela rapidez e eficiência das suas práticas cirúrgicas, nomeadamente amputações dos membros. Na altura, não havia ainda antissepsia , nem anestesia, pelo que a rapidez da intervenção cirúrgica era crucial para o doente. Tornou-se no cirurgião mais rápido do mundo ao executar amputações em dois minutos e meio (recorde: dois minutos e vinte e oito segundos). Era muito vaidoso. De tal forma, que solicitava à assistência, muitos dos quais eram estudantes, que o cronometrassem: “time me, gentlemen, time me”! Claro que a

"Botar faladura"

A primeira vez que falei em público foi há muitos anos, ainda era estudante. O meu professor, responsável pela iniciação à vida académica, obrigou-me a preparar uma conferência. Levei a incumbência de tal modo a sério a ponto de ter passado semanas a estudar, a compilar e a sintetizar tudo o que na altura poderia obter sobre o assunto. Foi após a revolução de abril, na Figueira da Foz. Enquanto os meus amigos e colegas andavam entretidos com a revolução, eu tinha que estudar para não fazer má figura. No dia da comunicação estava aterrorizado. Sala cheia. Depois, à medida que ia falando, acalmei, só voltando a ficar nervoso no momento do debate. Fizeram-me algumas perguntas, sobretudo um cavalheiro antipático, barbudo, de voz forte, agressivo e arrogante. Fiquei irritado com aquela atitude e recordo-me de ter respondido à maneira, de forma direta, objetiva e muito seca, tão seca que até fiquei sem saliva. Quando cheguei a Coimbra, a meio da tarde, caí na cama e dormi profundamente. Sent

"Dogmatismo" político

Enfim, é altura de fazer um pequeno desabafo. Não é que vá mudar o que quer que seja, mas sempre é uma opinião e não há nada melhor para o fígado do que libertar a bílis em excesso. Acompanho os jornais, amparo-me nalguns programas televisivos, leio blogs, poucos, mas, através do facebook, sou capaz de analisar o comportamento de muitas pessoas, as quais são verdadeiros fanáticos, preconceituosos, doentes, conseguindo fazer inveja aos proselitistas religiosos ou aos mafiosos absurdos do futebol e que ombreiam com "notáveis" comentadores políticos da nossa praça. Ponho-me a pensar se não existirá uma estreita relação entre os religiosos, os adeptos enraivecidos de qualquer equipa de futebol, de qualquer não, de duas ou três, porque as outras não passam de adornos, e alguns cidadãos com "veia" para a política. Parece que sim. Os fiéis da religião aceitam-na de forma incondicional, ajudando-os a passar o tempo, a ultrapassar as tragédias ou aceitar as benesses que lhes