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Ano novo

Nem só de pão vive o homem. Também vive de festas e de alegrias. Usa todos os pretextos para se divertir. Foi o que aconteceu com a passagem do ano. Por todo o mundo ocorreram inúmeras festividades que foram relatadas até à exaustão. Assisti a tudo sentado confortavelmente no meu sofá e no silêncio de uma paz construída à força. A passagem do ano é um fenómeno que entendo como uma forma de acreditar que o que é novo é diferente, mais feliz, mais pacífico, menos tormentoso do que foram os precedentes. Um ato de fé laico que a grande maioria partilha. Pessoalmente não me seduz tamanha festividade, talvez por uma questão de feitio ou devido ao acumular de lembranças que me obrigam a recordar o passado e pessoas que deixei de ver.
Na noite de passagem do ano os noticiários esquecem-se de relatar a tristeza e a miséria de muitos que devem olhar para o novo ano como a imagem do que já passou. Fazer crer que tudo irá mudar é uma mera questão de fé. A lotaria da vida irá sortear alguns ou malhar de infelicidade muitos dos que nessa noite gritaram de alegria e beberam espumante de fantasia. Fizeram bem. Gozaram pelo menos a noite do último dia.
Cansado, acordei um minuto depois da passagem do ano. Não vi nada de novo. Estou convicto que muito pouco de bom ou de justo irá ocorrer no ano que nasceu sem saber. Prefiro viver a realidade do dia-a-dia, embora sinta inveja dos que partilham tamanhas alegrias e fantasias. O mundo irá continuar na mesma, embrulhado em males da vida e enganando os que acreditam em melhorias.
No fundo sempre vale a pena gozar um breve momento de fantasia.

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