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"Novo dia"...

Começa um novo dia, um dia que vai gerar histórias, um dia que me vai surpreender com palavras, gestos, angústias, alegrias, tristezas, dúvidas, um pouco de chuva, com toda a certeza, e com algum cansaço que, a esta hora, hora em que começa o novo dia, já se faz sentir. Cansaço do corpo? Cansaço da alma? Cansaço da vida? Cansaço das desilusões? Talvez, um cansaço estranho e mais estranho fica no começo de um novo dia. Todos os dias têm um começo, mas há alguns que são a mera continuação ou uma péssima reprodução de outros que ficam na memória pelo desencanto. Há dias que começam com uma sensação de cansaço. Há dias que começam com ar fresco, frescura que não acalma, não adoça e nem embeleza o novo dia. Há dias, em que o começo do dia é velho, feio, pesado como muitos outros dias. Dia sem interesse, dia sem valor, um dia para passar como tantos outros dias. Talvez não, talvez não seja assim, tão mau, tão cinzento, tão desesperançado. Quem sabe se não terei arte e engenho para transforma

"Nomes"...

Nomes. Tudo tem um nome, se não tiver deixa de existir. É o nome que identifica o objeto, a ideia, a pessoa ou a montanha. Tem nome? Tem. Então existe. São tantos os nomes de pessoas que até custa a crer. Podiam ser todos diferentes mas não, algumas partilham os mesmos, sonoros, fechados, alegres, sorridentes, macambúzios, irritantes, disparatados, há para todos os gostos e para quem não tem gosto. Gosto de os pronunciar em voz alta ao mesmo tempo que olho para a face do dono. Gosto de misturar a musicalidade ou o ruído do nome com a expressão facial. Gosto de perguntar o nome dos filhos, gosto, porque sinto que o nome não é uma mera indicação de singularidade de uma pessoa, é muito mais do que isso, por vezes é o nome que molda a personalidade de um indivíduo. Há cada nome, há cada razão sem razão, há muita confusão e quem se lixa muitas vezes é o pequenino mexilhão. Eu nem me atrevo a dizer qual a minha opinião. Mas digo, agora estou a recordar. Quando o nome é suave, quando o nome t

"Natureza humana"...

Nasceu mal. Cresceu mal. Vive mal consigo e com os outros. Não presta. Não há solução. Há laivos episódicos de esperança? Sim, há. Há momentos dourados capazes de a enobrecer? Sim, há. Só que rapidamente se esfumam na memória. Há momentos de grandiosidade? Sim, há. Só que morrem rapidamente às mãos dos desonestos. Há garantia de uma melhor vida? Sim, há. Relegada para quando descer ao fundo de uma fria cova, porta de entrada no paraíso prometido. Há sinais de solidariedade? Sim, há. Quando a consciência se esconde atrás de gestos de vergonha de uma nudeza existencial. Há sinais de que a natureza humana irá um dia transformar-se em algo de belo, de poético, intemporal e universal? Não, não há. Nunca houve e nunca haverá. A natureza humana é tudo aquilo que não se vê, é tudo o que não se encontra. A natureza humana é má, má pela sua própria natureza, falsa pela vontade de a modificar, virtual, algo sem igual e sempre à espera de fazer mal. Nada pode a igualar. Há momentos que fazem esque

"Preso"...

Sinto-me preso. Preso ao relógio, preso à espera de outros, preso à vontade de quem desconheço, preso na solidão de um final de manhã, preso às mãos de poderes, preso sem liberdade de sonhar, preso sem poder fugir para os meus recantos, preso à vida, uma vida que não me satisfaz, uma vida que não me dá paz, uma vida que me aprisiona em redes de caprichos e de misérias. Ouço o toque de um sino preso na torre distante. Toca com tristeza. Sente-se preso. Toca de forma pausada como se cada toque não fosse mais do que a lamúria de uma chicotada. É diferente do meu sino, que é mais alegre, livre, espontâneo e que me prende como só ele sabe. Eu não me importo que me prenda, porque o seu som e intimidade são deliciosas formas de me libertar da vida. Aqui estou, ainda estou, preso à vontade dos outros, preso e ansioso por me libertar. Tenho fome, mas troco a fome do meu estômago pela fome de um momento de liberdade onde possa sentir o futuro, ver a esperança, admirar a beleza de um recanto e de

"Fim do dia"...

Aproxima-se o fim de mais um dia. Dei aulas, trabalhei, falei, comentei, passeei, acabei de ler o que me faltava, fui à baixa, cortei o cabelo, vi pessoas, olhei para as ruas, vi o que nunca tinha visto, passeei por locais onde me esqueci de passar, senti o cheiro a urina, ia inebriando-me com o álcool embutido nas vielas e ruelas da alta, fui quase atropelado por dois estudantes cegos de cerveja que se equilibravam agarrados um ao outro, apreciei arte esculpida nas paredes e espalhada nas ruas, revoltei-me contra os graffiti que desfeiam o património mundial, resolvi problemas do dia-a-dia e, agora, sentei-me a pensar no que deveria fazer. Eu sei, mas não me está a apetecer, o que eu queria era escrever e transmitir mil e um sentimentos, desenhar traços de alegria, pintar aguarelas coloridas da vida e terminar com um soluço da alma, um soluço de esperança, um soluço de paz, um soluço de vida. Talvez amanhã, longe, noutros ares, consiga ouvir a voz da inspiração. Talvez amanhã, ou ter

"Hébil"...

O Natal aproximava-se a passos vistos. As noites na baixa eram verdadeiros convites para saborear o frio, ver as montras e sentir o calor das luzes coloridas. O roncar metálico dos elétricos a saltitarem nos carris não incomodava, pelo contrário, conseguia dar um toque de vida forte ao belo espaço que era a baixa coimbrã. Fui de propósito à Galeria do Primeiro de Janeiro ver uma exposição de pintura. Entrei. Estava apenas um senhor de alguma idade, cabelo a cair sobre os ombros e que vestia uma gabardina que já deveria ter conhecido melhores dias. Pensei, deve ser alguma espécie de porteiro a vigiar o espaço vazio. Vi todos os quadros com detalhe até que parei em frente de um. Era o mais pequeno de todos e fugia à temática dos demais, nitidamente. Olhava, olhava mais uma vez e não conseguia sair dali. O senhor aproximou-se por detrás, sem que eu desse conta, e perguntou-me se eu gostava do quadro. -Sim. Gosto. Muito interessante. Tem qualquer coisa que me seduz. Riu-se e comentou: -

"Raiva e ódio"...

A raiva e o ódio são os gumes de punhais venenosos e mortais. Os seus autores não conseguem escondê-los durante muito tempo. As suas almas, bons berçários, não são o melhor pasto. A raiva e o ódio vivem à custa de almas inocentes. Explodem ao mínimo sinal. Entram nas pobres almas, e, rapidamente, começam a corroer as entranhas. Tamanha é a fome da destruição, tamanha é a dor da destruição e tamanha é a felicidade dos seus autores. Resta a morte da incompreensão, morte adiada, morte certa, morte esperada. Que morra, que mate, que desapareça. Maldito seja o turbilhão da raiva e do ódio que corrói sem compaixão um pobre coração. Santa Comba Dão, 21.09.2013