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"Preso"...

Sinto-me preso. Preso ao relógio, preso à espera de outros, preso à vontade de quem desconheço, preso na solidão de um final de manhã, preso às mãos de poderes, preso sem liberdade de sonhar, preso sem poder fugir para os meus recantos, preso à vida, uma vida que não me satisfaz, uma vida que não me dá paz, uma vida que me aprisiona em redes de caprichos e de misérias. Ouço o toque de um sino preso na torre distante. Toca com tristeza. Sente-se preso. Toca de forma pausada como se cada toque não fosse mais do que a lamúria de uma chicotada. É diferente do meu sino, que é mais alegre, livre, espontâneo e que me prende como só ele sabe. Eu não me importo que me prenda, porque o seu som e intimidade são deliciosas formas de me libertar da vida. Aqui estou, ainda estou, preso à vontade dos outros, preso e ansioso por me libertar. Tenho fome, mas troco a fome do meu estômago pela fome de um momento de liberdade onde possa sentir o futuro, ver a esperança, admirar a beleza de um recanto e deleitar-me com pensamentos, lembranças e fantasias. Não consigo, o tempo entrou na liça, vingativo e odioso. Quer torturar-me como só ele sabe. E sabe como ninguém. Vade retro tempo. Vade retro Satanás. Deixa-me em paz. Eu quero apenas viver a minha vida, mas não sou capaz. Tu, tempo, és a alma de Satanás.

Leiria, terça-feira, hora de almoço, 24.09.2014

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