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Escrever sem saber.

Não me importo de escrever e de dizer o que sinto. Mas não gosto muito que me leiam. O melhor seria usar uma tinta invisível como aquela com que me divertia em pequeno. Mas para isso teria de desenhar coisas belas que o calor do fósforo sabia despertar com entusiasmo e prazer o que o longínquo e estranho sol nunca conseguiu.
- O que é que estás a fazer?
-  Tinta invisível.
-  Para quê?
-  Para esconder o que sinto.
-  O quê! Explica isso melhor. Não explicava. Fingia que não ouvia, mesmo que repetissem.
-  Ó! Isto funciona mesmo. Grande limão.
-  Mostra. E eu mostrava. Viam apenas o meu nome em maiscúlas.
-  Então isto é que são os teus sentimento?
-  Não! É apenas a prova da minha assinatura.
-  Mas queres fazer uma assinatura?
-  Quero pois. Se não fizer ninguém sabe que fui eu.
-  Mas tu mal sabes escrever!
-  E depois? Tenho que começar por algum lado. Começo pelo meu nome, porque assim sempre sei que fui eu que escrevi.
-  Mas tu queres escrever o quê, se mal sabes escrever?
-  Deixa lá,não te importes. Talvez um dia possas ler e compreender.
-  És muito complicado.
-  Pois sou. Estás a ver o meu nome a aparecer? Olha. Vê-se tão bem, não se vê?
-  Sim. Mas tens de explicar melhor essa coisa de escrever o que sentes se ainda não sabes escrever como deve ser.
-  Está bem. Um dia hás de ver.
-  O quê? Respondiam-me com suspeita de que qualquer coisa preocupante poderia andar na costa.
É o que ando a fazer desde há muito. Escrever com tinta invisível para tornar visível os meus sentimentos e emoções.

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