Avançar para o conteúdo principal

Tempo....

Sai ladeado do tempo, assusta-me a sua companhia. Ainda bem que me ignora. Prepotente. Insensível aos desejos, surdo aos pedidos, não precisa de esperar ou de adiar o que quer que seja. Não necessita vangloriar-se do seu poder, isso sabe ele muito bem. Mesmo assim deixei que me acompanhasse. Paro. Descanso na subida, ele também para, não para descansar, não precisa, ele é dono de tudo. A brisa suave da tarde obriga-o a esvoaçar mesmo à minha frente e as andorinhas põem-se em cima às cavalitas. Ao fundo, as duas serras embrulhadas em névoa adormecem, escapando aos seus efeitos.
Curioso, pensa-se no tempo e ele obedece, fica mais lento, mais dócil, não sei se ele sente isso, mas eu sim. Somos feitos da mesma substância, mas eu penso, ele não, penso nele e na vida. É a mesma coisa, tempo e vida, não os compreendo, mas sinto-os. Eis aqui, a meu lado, uma vida que foi feita de tempo, tempo que não respeita a sua vida. Mas eu obriguei-o a parar. Por momentos? Sim. E agora? Agora libertei-o, não é fácil mantê-lo preso, mas só até ao momento em que um dia da vida de um ser humano se transforme na eternidade. Nessa altura desaparece o tempo. Ainda bem que não é eterno.

Comentários

Mensagens populares deste blogue

Fugir

Tenho que fugir à rotina. A que me persegue corrói-me a alma e destrói a vontade de saborear o sol e de me apaixonar pela noite.  Tenho que fugir à vontade de partilhar o que sinto. Não serve para grande coisa, a não ser para avivar as feridas. Tenho que fugir à vontade de contar o que desejava. Não quero incomodar ninguém. Tenho que fugir de mim próprio. Dói ter que viver com o que escrevo.

Nossa Senhora da Tosse

Acabei de almoçar e pensei dar a tradicional volta. Hoje tem de ser mais pequena para compensar a do dia anterior. Destino? Não tracei. O habitual. O melhor destino é quando se anda à deriva falando ao mesmo tempo. Quanto mais interessante for a conversa menos hipótese se tem de desenhar qualquer mapa. Andei por locais mais do que conhecidos e deixei-me embalar por cortadas inesperadas. Para quê? Para esbarrar em coisas desconhecidas. O que é que eu faço com coisas novas e inesperadas? Embebedo-me. Inspiro o ar, a informação, a descoberta, a emoção, tudo o que conseguir ver, ouvir, sentir e especular. Depois fico com interessantes pontos de partida para pensar, falar e criar. Uma espécie de arqueologia ambulatória em que o destino é senhor de tudo, até do meu pensar. Andámos e falámos. Passámos por locais mais do que conhecidos; velhas casas, cada vez mais decrépitas, rochas adormecidas desde o tempo de Adão e Eva, rios enxutos devido à seca e almas vivas espelhadas nos camp...

"Salvem todos"...

Tenho que confessar, não consigo deixar de pensar nos jovens aprisionados na caverna tailandesa. Estou permanentemente à procura de notícias e evolução dos acontecimentos. Tantas pessoas preocupadas com os jovens. Uma perfeita manifestação de humanidade. O envolvimento e a necessidade de ajudar os nossos semelhantes, independentemente de tudo, constitui a única e gratificante medida da nossa condição humana. Estas atitudes, e exemplos, são uma garantia que me obriga a acreditar na minha espécie. Eu preciso de acreditar. Não invoco Deus por motivos óbvios. Invoco e imploro que os representantes da minha espécie façam o que tenham a fazer para honrar e dignificar a nossa condição. Salvem todos, porque ao salvá-los também ajudam a salvar cada um de nós.