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Rio de águas doces...



"Porque é que deveria ter saudades tuas, ao longo de um claro rio de águas doces?" Diz o poema da bela canção. Por uma razão muito simples, apetece-me ser pagão e adorar todas as formas de vida e todo o tipo de beleza. Escrever isto num templo parece uma heresia. Mas não é, é uma forma pura de querer amar a vida mesmo que esta nem sempre nos queira bem. A vida é "um claro rio de águas doces" onde me apetece deixar embalar e seguir a sua vontade até à foz, onde o esquecimento apagará as turbulências da existência deixando apenas alguns poemas dispersos pelo vento que, apressadamente, corre sobre a corrente da sua irmã gémea até à nascente do rio e foz do vento. É uma beleza ver o claro rio de águas doces a roçar a todo o momento o suave e vibrante rio de vento que lhe afaga as suas mágoas. É uma beleza limpar a dor e o sofrimento do vento abrandando as suas angústias com águas claras e doces. Vento e água, água e vento, a correrem sem pressa para a nascente de um e foz do outro amando-se como só a água e o vento sabem. Eu olho-os e eles não se importam. Mas como podiam importar-se? Também são pagãos e precisam de ver um humano a adorá-los mesmo na penumbra de um templo, mas com a alma livre e desejosa de correr entre a nascente e a foz, seja a do vento suave e vibrante seja a de um claro rio de águas doces. Viver é isso mesmo, correr sem sentido entre a nascente e a foz de um e a nascente e a foz do outro.
Quero ser vento e água, quero ser água e vento, até deixar de ser água e vento e nascer para outra vida. Ser pagão é compreender a vida. Ser pagão é criar vida.

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