Amanhã vou dar uma volta. Pode ser que regresse, mas também posso não voltar. Não é propriamente uma viagem, mas uma ida até aos confins do meu interior. O que é que vou fazer, revirar a alma e procurar no sótão atulhado, e cheio de teias de aranhas, motivos ou objetos que alimentem a inspiração. Não é difícil. O problema é o pó do tempo. Mas com o pó sei eu lidar, tenho mais dificuldade com as pessoas. Eu compreendo-as. Nem invoco as razões. Faz parte da minha natureza e de muitos anos a perscrutar corpos e almas.
Custa-me imenso provocar dor, tristeza, raiva ou indignação. Neste mundo de comunicação intensiva, a falta de som, de cor, de calor, de expressão, cerce e até distorce os objetivos das palavras. Eu sei que fazemos parte do verbo. O problema é a conjugação com o sentir e a visão do próximo. Também me insurjo e até sou capaz de sentir raiva e indignação, mas tempero-as e acabo, muitas vezes, por engolir em seco, até porque este tipo de reação gera reação como se fosse o núcleo radioativo de uma central nuclear. Parar a tempo é a melhor solução.Sendo assim, vou dar uma volta. Nada melhor do que uma peregrinação através da alma, do pensamento, da reflexão e da escrita esculpida em silêncio para depois poder ser guardada na escuridão de um céu estrelado. Vai ficar tão longe que não há olhos nem imaginação capazes de a ler ou decifrar. Os segredos do universo são tentadores. Fica-se com a sensação de que vamos desfrutar maravilhas sem que tenhamos vontade de regressar a casa. A vantagem de calcorrear o universo é esse mesmo, embriagar-nos sem conhecer o sentido da palavra saudade.
(PS - Amanhã é dia dos meus santos preferidos. Santos que nunca fizeram milagres, e ainda bem. São santos de verdade. Foram mártires. Amanhã é o dia de São Thomas More e de São John Fisher. Irei reproduzir um ou dois textos sobre eles.)