Sol negro


Apetece-me fugir da vida, mas acabo por verificar que é a vida que foge de mim. A sensação de frustração é violenta e muito dolorosa. Olho, ouço e sinto que não consigo encontrar o meu lugar. Cada dia que passa fico mais distante do desejado. Almas humanas embrutecidas, cuja aparente humildade esconde muita arrogância e oceanos de mesquinhez, ofendem-me e fazem com que não entenda o verdadeiro significado da fé. Fé? Sorrio. Uma palavra que começo a desprezar e até a odiar. Fico confuso com tão estranhas sensações, querer ajudar os que precisam e lutar pelo meu desejado e cada vez mais distante destino. Apetece-me fugir, mas a vida goza comigo. É ela que foge com arrogância e desprezo a ponto de querer esquecer tudo e refugiar-me numa torre, não de marfim, mas de ilusões, doces, suaves e coloridas, capaz de pulsar ao som do bater de um pobre coração enlouquecido por ter viver uma vida sem qualquer sentido. Fujo. Apago-me. Silencio-me. Amuralho alguns pensamentos. Os que saem, ainda, procuram as brechas de paredes rochosas que tento colocar em meu redor até poder sucumbir sem fé, sem esperança e sem dor no silêncio do esquecimento, afastado de um mundo que me ofende e humilha a cada dia que passa. Custa sentir a vida cheia de farpas, de ignomínias, de desprezo, de falta de sentido, parca em recompensas e, sobretudo, incapaz de oferecer um amor vivo que me permita adubar as sementes de novas ideias e desejos que vagabundeiam na minha alma. Acabam por morrer nas sombras da indiferença e no silêncio de um sol negro.

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