Avançar para o conteúdo principal

"Templos a pagar"...


Quando o cabelo começa a incomodar-me tenho de ir à tosquia. O pior é arranjar tempo, mas assim que consigo uns trocos vou a correr até à baixa. Hoje, tive a tarde livre, não estava programada, foi-me muito útil. Passeei, cortei o cabelo, dei voltas e mais voltas pela baixa, sempre debaixo de um vento nervoso e de um frio inquietante.
Subi o Quebra-Costas, lentamente, em contraste com os meus tempos de estudante, e olhei para a Sé Velha. Vi que tinha a porta aberta. Pensei, há quanto tempo não entro naquele espaço? Há muito, talvez há demasiado, espero que não tenha sido aquando do batizado da minha filha do meio, porque, se foi, é uma vergonha. Como estava um pouco cansado, e nada me atormentava, exceto o vento desagradável, subi a escadaria com o propósito de passar uns minutos no templo. Gosto imenso de sentar e descansar em igrejas ou capelas. São excelentes fontes de inspiração. Ao entrar, do lado esquerdo, um papel colado na porta ou na cortina, não sei bem, ostentava o seguinte aviso, "visita 2 euros, contributo para as obras". Fiquei incomodado, virei as costas e fui embora. Não é a primeira vez que   acontece, pedirem-me dinheiro para entrar num templo religioso. Deem as explicações que quiserem, não as aceito, abomino ter de esportular seja qual for a quantia para entrar. Fico com uma sensação tão desagradável que me dispenso de escrever o que sinto. 
Este episódio obrigou-me a recordar um outro ocorrido há poucos dias, quando a minha filha mais velha foi à "Rainha Santa". Ao entrar perguntaram-lhe se era para visitar ou para rezar. Respondeu: as duas coisas. Então tem de pagar. E se for só para rezar? Não paga. Resposta: então eu vou só rezar.
Não sei o que é feito das caixas das esmolas. Como não devem dar grande coisa, lembram-se destas artimanhas "comerciais".
Por enquanto ainda vou entrando em igrejas e capelas deste país, mas só se a entrada for livre. Gosto de entrar. Gosto de me sentar. Gosto de respirar o ar. Gosto de saborear o silêncio e adoro inspirar-me nestes locais. Hoje não entrei na Sé Velha e provavelmente nunca mais irei entrar. Não faz mal, uma pequena capela ou uma modesta igreja conseguem provocar as mesmas sensações. 
Agora, recordo que já não vou à "Rainha Santa" há muitos anos, local onde me casei. Ponho-me a pensar na resposta que terei de dar ao senhor quando me perguntar: é para visitar ou para rezar? Olhe, eu vim para descansar, para meditar e para me inspirar. Tenho de pagar alguma coisa para isso? Se tiver, viro as costas e nunca mais ponho os pés naquele lugar, nem mesmo que o sujeito se lembre de me fazer um desconto face à minha resposta. Era o que mais faltava ter de pagar para entrar num templo religioso! Nem pensar.
Estou a escrevinhar este texto no meu gabinete, ouvindo a "Cabra" a tocar e a olhar para a "Torre". À borla! O meu gabinete é maravilhoso e também é um belo local para trabalhar, para descansar e para me inspirar. Mas, mesmo assim, os raios dos templos são muito melhores...


Comentários

Mensagens populares deste blogue

Fugir

Tenho que fugir à rotina. A que me persegue corrói-me a alma e destrói a vontade de saborear o sol e de me apaixonar pela noite.  Tenho que fugir à vontade de partilhar o que sinto. Não serve para grande coisa, a não ser para avivar as feridas. Tenho que fugir à vontade de contar o que desejava. Não quero incomodar ninguém. Tenho que fugir de mim próprio. Dói ter que viver com o que escrevo.

Nossa Senhora da Tosse

Acabei de almoçar e pensei dar a tradicional volta. Hoje tem de ser mais pequena para compensar a do dia anterior. Destino? Não tracei. O habitual. O melhor destino é quando se anda à deriva falando ao mesmo tempo. Quanto mais interessante for a conversa menos hipótese se tem de desenhar qualquer mapa. Andei por locais mais do que conhecidos e deixei-me embalar por cortadas inesperadas. Para quê? Para esbarrar em coisas desconhecidas. O que é que eu faço com coisas novas e inesperadas? Embebedo-me. Inspiro o ar, a informação, a descoberta, a emoção, tudo o que conseguir ver, ouvir, sentir e especular. Depois fico com interessantes pontos de partida para pensar, falar e criar. Uma espécie de arqueologia ambulatória em que o destino é senhor de tudo, até do meu pensar. Andámos e falámos. Passámos por locais mais do que conhecidos; velhas casas, cada vez mais decrépitas, rochas adormecidas desde o tempo de Adão e Eva, rios enxutos devido à seca e almas vivas espelhadas nos camp

Guerra da Flandres...

Exmo. Senhor Presidente da Câmara Municipal de Santa Comba Dão. Exmas autoridades. Caros concidadãos e concidadãs. Hoje, Dia de Portugal, vou usar da palavra na dupla qualidade de cidadão e de Presidente da Assembleia Municipal. Palavra. A palavra está associada ao nascer do homem, a palavra vive com o homem, mas a palavra não morre com o homem. A palavra, na sua expressão oral, escrita ou no silêncio do pensamento, representa aquilo que interpreto como sendo a verdadeira essência da alma. A alma existe graças à palavra. A palavra é o seu corpo, é a forma que encontro para lhe dar vida. Hoje, vou utilizá-la para ressuscitar no nosso ideário corpos violentados pela guerra, buscando-os a um passado um pouco longínquo, trazendo-os à nossa presença para que possam conviver connosco, partilhando ideias, valores, dores, sofrimentos e, também, alegrias nunca vividas. Quando somos pequenos vamos lentamente percebendo o sentido das palavras, umas vezes é fácil, mas outr