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Claustro


O velho claustro, escondido dos humanos e perdido debaixo das águas do Mondego durante séculos, emerge, à luz do sol, a beleza anquilosada de um passado rico, com os seus segredos, angústias, tristezas, pecados e desejos nunca revelados. Piso as suas sepulturas, ouço as suas vozes, e entristece-me que violem os seus sonhos. Leio os nomes e datas, e reparo que podiam estar agora a meu lado. O calor do respaldar de um banco de pedra, afastado na altura da luz do sol, obrigou-me a saborear a mesma brisa que acalmou as almas penitentes de quem já sofreu. O céu é o mesmo, o ar brilha cheio de cor, os pensamentos não são diferentes enquanto os restos dos corpos sofrem o peso dos pés e o barulho de gente que não respeita ninguém, pecadores ou inocentes. Deixo que os meus pensamentos se impregnem pelos que aqui foram largados, criados, alagados e nunca mais lembrados. Soube-me bem pisar chão sagrado, alivia quem repousa e ajuda quem anda cansado.

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Fugir

Tenho que fugir à rotina. A que me persegue corrói-me a alma e destrói a vontade de saborear o sol e de me apaixonar pela noite.  Tenho que fugir à vontade de partilhar o que sinto. Não serve para grande coisa, a não ser para avivar as feridas. Tenho que fugir à vontade de contar o que desejava. Não quero incomodar ninguém. Tenho que fugir de mim próprio. Dói ter que viver com o que escrevo.

Nossa Senhora da Tosse

Acabei de almoçar e pensei dar a tradicional volta. Hoje tem de ser mais pequena para compensar a do dia anterior. Destino? Não tracei. O habitual. O melhor destino é quando se anda à deriva falando ao mesmo tempo. Quanto mais interessante for a conversa menos hipótese se tem de desenhar qualquer mapa. Andei por locais mais do que conhecidos e deixei-me embalar por cortadas inesperadas. Para quê? Para esbarrar em coisas desconhecidas. O que é que eu faço com coisas novas e inesperadas? Embebedo-me. Inspiro o ar, a informação, a descoberta, a emoção, tudo o que conseguir ver, ouvir, sentir e especular. Depois fico com interessantes pontos de partida para pensar, falar e criar. Uma espécie de arqueologia ambulatória em que o destino é senhor de tudo, até do meu pensar. Andámos e falámos. Passámos por locais mais do que conhecidos; velhas casas, cada vez mais decrépitas, rochas adormecidas desde o tempo de Adão e Eva, rios enxutos devido à seca e almas vivas espelhadas nos camp...

"Salvem todos"...

Tenho que confessar, não consigo deixar de pensar nos jovens aprisionados na caverna tailandesa. Estou permanentemente à procura de notícias e evolução dos acontecimentos. Tantas pessoas preocupadas com os jovens. Uma perfeita manifestação de humanidade. O envolvimento e a necessidade de ajudar os nossos semelhantes, independentemente de tudo, constitui a única e gratificante medida da nossa condição humana. Estas atitudes, e exemplos, são uma garantia que me obriga a acreditar na minha espécie. Eu preciso de acreditar. Não invoco Deus por motivos óbvios. Invoco e imploro que os representantes da minha espécie façam o que tenham a fazer para honrar e dignificar a nossa condição. Salvem todos, porque ao salvá-los também ajudam a salvar cada um de nós.