Minguar


Gosto dos dias longos. Preferencialmente quando começam a crescer. Sentir mais dois minutos de dia é suficiente para acreditar no prolongamento da vida que se arrasta atrás da luz do sol como se fosse a bela cauda de um cometa. O pior é quando os dias começam a minguar. Assustam-me. É nesta altura do ano que dou conta, com particular desilusão, o envelhecer do ano. Já vi as folhas dos plátanos amarelas. Começam a cair e a tristeza começa a invadir-me. É a morte lenta que me apoquenta. Durante a tarde finjo que está tudo bem, o pior é o mergulho cada vez mais rápido do sol atrás das montanhas. Sinto que me rouba muitas ilusões, deixando no ar, num rasto anilado, o vazio e a melancolia.
Viver neste mundo é aflitivo. Não há forma de o mundo crescer ou rejuvenescer. Sempre os mesmos problemas, as mesmas torturas, os mesmos males, as mesmas mortificações, os mesmos ódios, as mesmas vinganças e as mesmas promessas de deuses invejosos e sem caráter, que alimentam de prazer os seus adoradores sedentos de poder.
Os dias minguam, mas a violência, o ódio e a raiva aumentam a cada dia que passa. Acompanho o ciclo do ano, uma dança triste que não consegue esconder o que se passa na estapafúrdia cabaça, a quem chamam terra, que ameaça os que têm de beber o fel da vil taça.


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