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"Diferença"...


Como é que sabemos que estamos diferentes? Quando deixamos de sentir uma necessidade que até há pouco nos alimentava e estimulava. Algo que nos empurrava, que nos divertia, que nos fazia sentir melhor, que justificava a nossa forma de ser e de estar e que lentamente se apaga, ou melhor, se transforma na diferença. Na essência nada muda, o que se altera é a forma, enriquecendo o conteúdo. Escrever tem dessas coisas. Escreve-se com muitos motivos e por muitas razões. Começa-se sempre por algum lado, depois vai crescendo, torna-se mais exigente, mesmo gratificante e por fim começa-se a escrever sem razão, sem motivo e para ninguém. Já falta pouco para começar a escrever para ninguém, a não ser para o próprio. Quando isso acontecer será uma maravilha, é chegar a um momento de total liberdade. Quando isso acontecer poucos serão o que irão ler o que escrevo e quando lerem talvez já não saboreie as doces manhãs e as intensas noites. Ser livre é escrever sem receio de que outros possam ler. Ainda não chegou esse momento, penso que um dia lá chegarei, quando, não sei, só sei que sinto que tem de ser assim. E se não lerem depois? Não faz mal, já foi escrito muita coisa que nunca foi lido, talvez as coisas mais belas que o mundo nunca conheceu. Basta imaginá-las, basta fechar os olhos e senti-las. Andam por aí, frases e palavras desgarradas como átomos perdidos, soltas, livres, que, de tempos a tempos, silenciosamente, e no maior segredo do universo, se juntam para se embriagarem com a perfeição da beleza. Depois, cada uma das palavras e das frases vão à sua vida, até chegar o momento de acasalarem novamente e explodirem em novas palavras e novas frases. Um ritual do verbo de quem até os próprios deuses têm inveja, presos que estão à sua triste eternidade. As palavras e as frases são voláteis, não precisam de deuses, têm a sua forma própria de viver, a liberdade absoluta.

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