"Suavidade"...


O quadro cedo começou a desenhar-se, uma agradável frescura entrou repentinamente pela janela como se fosse um animal de estimação a lamber de alegria o dono. Olhei e não vi nada. Nem tinha que ver, mas sim sentir. Parou, para voltar mais algumas vezes. Ria-se e bocejava ao mesmo tempo. É o que faz ter a janela aberta, entra quem pode entrar, e eu deixei. O tempo, o tempo do sol, das nuvens e da cálida manhã corria e brincava como se estivesse no adro de uma igreja desafiando os rituais. Livre, o tempo do sol, das nuvens e da cálida manhã fazia das suas, cantarolava e, suavemente, começou a seduzir-me, como se fosse preciso chamar-me a atenção. Fiz de conta que sim, que estava a ser seduzido, nada melhor do que contentar o tempo do sol, das nuvens e da cálida manhã. 
À tarde, o tempo do sol e das nuvens, cansado, espraiou-se languidamente em pensamentos, leituras e em sonhos. Viu-me e quis mostrar novamente a sua arte de sedução. Eu fingi que sim, que estava a ser seduzido por ele, mas ele não sabia que era eu que tentava seduzi-lo. Suavemente, o tempo, não o tempo do sol e das nuvens, mas o de Cronos, pediu para entrar no jogo. Olhámos um para o outro, eu e o tempo do sol e das nuvens, e, em uníssono, dissemos-lhe: - Está bem, podes entrar mas com suavidade. Ouviste? - O safado riu-se e disse: - Prometo. E não é que o sacana está a cumprir a palavra? Brinca connosco com tamanha suavidade que até esquecemos que existe...

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