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"Miolo de pão"...

Ontem não escrevi. Ontem não tive tempo. Ontem foi dia de pica bois. Ontem já passou e nada deixou. E se deixou foi pouco, algumas conversas, um ou outro sorriso lançado no ar conjuntamente com uma enorme gargalhada muda, uma pequena observação, um sinal de que há gente que confia nos filhos de qualquer ontem e também comportamentos inusitados e inesperados. Há sempre uma qualquer singularidade que se pode medir em função da estupidez e da desconfiança. A boca entreabre-se e o espanto escorre como espuma, como se fosse sinal de manifestação de um toleirão. 
Ontem foi mais um dia que se escondeu do passado e não deixou grande alegria. Os "ontens" são mesmo assim, sacos inesperados que libertam odores amargos deixando antever o fim de outros dias. Não servem para grande coisa, apenas deixam uma ou outra recordação capaz de amenizar o coração. Prefiro o dia de amanhã, porque o de hoje vestiu-se como se fosse uma coquete a querer mostrar que é já um ontem cheio de beleza e de gratidão. 
Triste passagem do tempo, repete-se sempre sem sentido, deixando-me à beira do abismo. Mas para que serve tudo isto? Para nada. Triste acontecimento ter sido um dia criada a vida. Mais valia ter sido inventada apenas almas livres que soubessem saborear a doce ilusão. Viver na ilusão é muito melhor do que andar neste mundo sem sentido, sem norte, sem sul, sem céu, sem mar, sem nada. O melhor é esfregar a bola do universo na mão como se fosse o miolo de um pão e depois lançá-la ao chão. 

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