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Sentado no chão...


Sentado no chão, isolado do mundo e de qualquer inspiração. Deixo-me embalar pelas recordações de outros tempos em que não sabia onde ficava o futuro. Com o tempo encontrei-o. Não o aprecio. Faz-me recordar os velhos momentos em que os pensamentos morriam assim que acabavam de nascer. Não deixavam grandes marcas, apenas algumas cicatrizes que o tempo faria o favor de temperar. Recordo esses momentos atribulados, mas com algum sentido, porque era tão natural como a própria vida. Não tinha termo de comparação, nem sofria da síndrome da ilusão, tudo andava ao sabor do vento e do encanto do momento. Sentado no chão, debulhava o velho termo comendo aquilo que a minha mãe tinha preparado à noite, a refeição do dia seguinte. Sentado no muro, sentado no pinhal, sentado numa pedra ou em qualquer lugar, comia sem saborear o conteúdo. Agora consigo recordar o seu sabor, algo insubstituível, porque tinha o amor da minha mãe. Alimentava o meu corpo e semeava a recordação no futuro. Gostava do seu arroz e do pequeno bocado de carne cozinhado por mãos de fada. Recordo com nostalgia o seu sabor. Nada melhor do que estar sentado no chão, depois de ter ido ao futuro, quase que me apetecia dizer, para quê? Foi em vão? Talvez não, mas não tenho boas lembranças do futuro, preferiria mil vezes voltar aqueles momentos onde podia desfrutar o prazer de uma humilde refeição, alimentando o corpo e permitindo desenvolver a minha razão que acabaria mais tarde por morrer às mãos da mais estranha ilusão. Nada melhor do que escrever, olhando para o mar, à sombra da vida e sentado no chão. Afastado de todos, menos da minha bela musa, a inspiração louca de uma existência fosca e ferida nas profundezas do seu coração. Aqui estou, no sítio de onde nunca deveria ter saído, do chão, local onde os melhores seres conseguem compreender a razão de viver e morrer na esperança de uma fugaz ilusão.
Sentado no chão.  

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