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Imaginar


Correr lugares já conhecidos permite saborear velhos gostos, tempos e momentos. Faço-o com alguma frequência. Cruzo a minha vida com a de outros dos quais apenas reconheço que são portadores da essência da vida. Não sei o que pensam e quem são. Movem-se e olham em redor no momento em que passo. São pessoas obrigadas a viver e a partilhar os seus sentires. Ponho-me a imaginar quem são. Provavelmente o meu pensar não coincide com a realidade. Não importa, ficcionar é a forma mais elegante de construir a realidade desejada e não a esperada. Aprendo muito. Reconheço a minha permanente forma de tentar compreender pequenos gestos, breves acontecimentos e o circular de sentimentos anónimos e ricos em sabedoria perdida como sendo a fonte da água da verdadeira vida. Deslumbrei-me com a velha capela conhecida e consegui ver numa perspetiva diferente o arco da sua torre sineira. Vi a varanda de madeira, a fonte real, os velhos solares, os templos de muitas vidas e de muitas mais lembranças, velhas ruas por onde passei vezes sem conta, onde me cruzo com pensamentos semeados ao longo de séculos e até procurei o assador de castanhas que hoje deve ter feito ponte ou, então, já não tem mais castanhas. Fiquei um pouco ácido por não ter apreciado o doce quente e cheio de meia dúzia de castanhas. Senti o amargo sabor do que é ser augado. Andei, recordei, senti, vivi e compreendi. O mundo faça o que que fizer está a ficar mais triste e esfria mesmo num inverno particularmente quente. Resta-me imaginar e recriar tudo o que já foi inventado esperando encontrar a qualquer momento o que nunca foi encontrado ou desejado.

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