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Paredes velhas


O quadro está à minha frente. Nasceu de uma lembrança, navegou numa mensagem e chegou ao conhecimento do artista. Deve-lhe ter despertado recordações e emoções em rápidas viagens de saudade ao seu passado. Não nasceu apenas das mãos do autor, surgiu da sua memória. Imagino que naquele espaço tenha sentido e vivido o que nunca mais irá sentir, ver, saborear, tocar ou olhar. A luz da manhã entraria pela janela que se fechava para o espaço envolvente enquanto se abria para a sua mente. O sol já apareceu e bateu-lhe como nos outros tempos. As cores sujas das paredes acentuaram-se durante alguns momentos como se estivesse a sorrir. O branco emergiu limpo e o amarelado intensificou-se como se fosse a cor do sol. Até o cinzento-escuro provocado pela humidade e a passagem do tempo adquiriu vida. As paredes velhas a meias com duas figuras humanas testemunham a presença de almas naquele espaço aparentemente perdido e cheio de encanto. Aves sobrevoam.
Os quadros não falam mas obrigam a sentir. Não é apenas o sentido estético que está em causa são as sensações que despertam em várias pessoas numa espécie de cadeia e de solidariedade que se perde no andar do tempo deixando que os elos voem como se fossem nuvens a beijar altares desconhecidos da vida.

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