Sol e noite


Sinto uma espécie de vazio desejoso de beber alguma fantasia. O mundo oscila em redor de uma estrela que aquece e ilumina apenas quem lhe apetece. Atributos ou prerrogativas de quem tem força e gosta de dominar os mais pobres e indiferentes ao seu poder e encantamento. Um astro que já foi rei, deus, e que agora nega calor e paz aos viajantes do sofrimento. O esquecimento é o alvo dos seus raios que até parecem ser sedosos e prazenteiros. Nasce e percorre o firmamento com arrogância, destilando desprezo e cativando os mais incautos. O sol julga que, por ser o maior dos astros, capaz de iluminar e aquecer tudo o que estiver ao seu alcance, tem de ser adorado por todos. O melhor é fingir que sim. É rei, é senhor, é deus, é uma estrela que alimenta com a energia vertida pelo seu poderoso ventre os que procuram, na sua ausência, a tranquila e suave noite, esperança e explicação para o mais estranho e inusitado fenómeno, a vida. Também tu, sol, hás de morrer um dia e ninguém se lembrará ou chorará por ti. Não acreditas? Espera e verás. Digo eu durante a noite, esperando que não me vejas, ouças ou sintas. Amanhã, quando nasceres, não vou dizer nada. Ficarei calado e escondido, não vás querer punir-me pelo meu atrevimento e pensamento.

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