Avançar para o conteúdo principal

"Folhas"...

Ainda não começaram a cair em força, mas já estão a perder a frescura, dobram-se, não falam, não cantam de alegria e gemem de dor sob o vento que lhes seca as poucas lágrimas que ainda tem. Querem amarelecer e envergonham-se de não poderem viver. Querem fugir para longe nas asas do vento. Ficam livres da vida e presas da morte. Envergonham-se, mas não têm medo. Querem voar e sentir o que nunca sentiram. Como se pode sentir o mundo quando se está preso à vida? São folhas, algumas a avermelharem-se, outras a serem salpicadas de pequenos pontos amarelados e outras a quererem ansiosamente morrer antes do tempo ou marcar o início do novo tempo. Algumas folhas vêm atrás de mim. Correm. Param. Voltam a andar e os seus sons secos de lamúria ou de desencanto chamam-me a atenção. Paro. Olho para trás e elas param, não com medo, mas aflitas por não saberem para onde ir. Sons de brisa, sons de folhas secas a seguirem-me e sons de árvores desejosas de se despirem, sons dentro do meu silêncio. Têm sono. Querem dormir. Eu quero ficar acordado para as ver. Preciso de as sentir e de as acompanhar no belo colorir do seu apagar...

Comentários

Mensagens populares deste blogue

Fugir

Tenho que fugir à rotina. A que me persegue corrói-me a alma e destrói a vontade de saborear o sol e de me apaixonar pela noite.  Tenho que fugir à vontade de partilhar o que sinto. Não serve para grande coisa, a não ser para avivar as feridas. Tenho que fugir à vontade de contar o que desejava. Não quero incomodar ninguém. Tenho que fugir de mim próprio. Dói ter que viver com o que escrevo.

Nossa Senhora da Tosse

Acabei de almoçar e pensei dar a tradicional volta. Hoje tem de ser mais pequena para compensar a do dia anterior. Destino? Não tracei. O habitual. O melhor destino é quando se anda à deriva falando ao mesmo tempo. Quanto mais interessante for a conversa menos hipótese se tem de desenhar qualquer mapa. Andei por locais mais do que conhecidos e deixei-me embalar por cortadas inesperadas. Para quê? Para esbarrar em coisas desconhecidas. O que é que eu faço com coisas novas e inesperadas? Embebedo-me. Inspiro o ar, a informação, a descoberta, a emoção, tudo o que conseguir ver, ouvir, sentir e especular. Depois fico com interessantes pontos de partida para pensar, falar e criar. Uma espécie de arqueologia ambulatória em que o destino é senhor de tudo, até do meu pensar. Andámos e falámos. Passámos por locais mais do que conhecidos; velhas casas, cada vez mais decrépitas, rochas adormecidas desde o tempo de Adão e Eva, rios enxutos devido à seca e almas vivas espelhadas nos camp...

Guerra da Flandres...

Exmo. Senhor Presidente da Câmara Municipal de Santa Comba Dão. Exmas autoridades. Caros concidadãos e concidadãs. Hoje, Dia de Portugal, vou usar da palavra na dupla qualidade de cidadão e de Presidente da Assembleia Municipal. Palavra. A palavra está associada ao nascer do homem, a palavra vive com o homem, mas a palavra não morre com o homem. A palavra, na sua expressão oral, escrita ou no silêncio do pensamento, representa aquilo que interpreto como sendo a verdadeira essência da alma. A alma existe graças à palavra. A palavra é o seu corpo, é a forma que encontro para lhe dar vida. Hoje, vou utilizá-la para ressuscitar no nosso ideário corpos violentados pela guerra, buscando-os a um passado um pouco longínquo, trazendo-os à nossa presença para que possam conviver connosco, partilhando ideias, valores, dores, sofrimentos e, também, alegrias nunca vividas. Quando somos pequenos vamos lentamente percebendo o sentido das palavras, umas vezes é fácil, mas outr...